Líder do governo regional ignora medidas de austeridade
Jardim usa sete milhões de empresa pública falida para construir campo de golfe
O governo regional da Madeira, através
de deliberação ontem publicada no Jornal Oficial, autorizou a
transferência de sete milhões de euros, da Sociedade de Desenvolvimento
do Porto Santo (SDPS) para a da Zona Oeste, com o fim de financiar a
obra do Campo de Golfe da Ponta do Pargo, incluída no plano de
investimento desta sociedade anónima de capitais exclusivamente
públicos.
Nick Faldo, ex-jogador de golfe, projecta campo para a Madeira
(Foto: Kevin Coombs/Reuters) Ignorando as novas medidas de austeridade
integradas no acordo com a troika que põe travão a investimentos em
obras públicas sem viabilidade, a Resolução n.º 555/2011 assinada por
Alberto João Jardim releva "o carácter estruturante da obra" do novo
campo de golfe, adiantando que "tem enquadramento no Plano de
Desenvolvimento Económico e Social da Região Autónoma da Madeira para o
período 2007-2013". E, ao justificar a transferência entre as duas
entidades societárias - cujo capital é detido em mais de 90 por cento
pelo governo regional, ficando o remanescente para os respectivos
municípios -, reconhece "as dificuldades que actualmente se colocam na
obtenção de financiamento junto da banca".
A transferência da
verba - parte não utilizada de um empréstimo contraído em 2007, com o
aval do governo regional envolvendo o Banco EFISA (do grupo BPN) e a
Banca OPI - foi possível, frisa a resolução, devido à "conjuntura
económica que obrigou à revisão do plano de actividades da SDPS" -
também proprietária de um campo de golfe, e ao cancelamento de algumas
obras anteriormente previstas.
Concebido pela empresa inglesa
Nickfaldo Design, do conhecido ex-golfista britânico Nick Faldo, o campo
de 18 buracos está a ser implantado em terrenos expropriados pelo
governo regional que considerou o investimento como potenciador do
desenvolvimento da freguesia sem quaisquer infra-estruturas turísticas. O
polémico processo de aquisição dos terrenos agrícolas, compreendendo
uma área de 80 hectares, teve um custo superior a seis milhões de euros e
foi contestado pela população local que reivindicava o investimento em
equipamentos de maior interesse público. Mas, após algum impasse que
motivou alguma especulação quanto à construção da infra-estrutura e sua
viabilidade económica face às contingências financeiras que a região
atravessa, o presidente da sociedade pública promotora, Paulo Sousa,
garantiu que "nunca se equacionou a interrupção".
Apesar das
expectativas criadas quanto ao seu sucesso, fortemente dependente das
receitas a obter com a comercialização dos projectos imobiliários
associados, as sociedades de desenvolvimento "apresentam níveis de
exploração e resultados preocupantes, cuja continuidade põe em causa a
sustentabilidade económico-financeira dos respectivos investimentos e a
própria continuidade das empresas", concluiu em 2008 o Tribunal de
Contas, numa auditoria ao financiamento das sociedades, orientada para a
análise do volume de endividamento contraído e para a análise da
capacidade dessas empresas satisfazerem o correspondente serviço da
dívida. Um dos casos de insucesso mais criticados pela oposição é o da
marina do Lugar de Baixo, em que Jardim já investiu mais de 70 milhões,
mas está inoperacional.
Para saldar os compromissos imediatos
assumidos com a banca, o governo regional, por resoluções publicadas no
Jornal Oficial a 19 de Abril, concedeu a três sociedades uma
comparticipação financeira de 4,5 milhões de euros. Em 2007, para
colmatar insuficiências financeiras destas empresas públicas, o governo
procurou financiá-las através da assinatura de diversos contratos anuais
de alegada "prestação de serviços inerentes à disponibilização de
espaços infra-estruturados de acesso público, gratuito e limitado". Por
considerar ilegais, o Tribunal de Contas recusou o visto desses
contratos que, com vigência variável entre os 4 e os 15 anos,
sucessivamente renováveis, permitiria a Jardim transferir anualmente
para as quatro sociedades (Metropolitana, Porto Santo, Ponta Oeste e do
Norte) um total de 6,95 milhões de euros, sem IVA.