Diário de Férias II Os Labregos
Chegaram em
estilo, monovolume da moda, cheio de extras, ele sai do carro, calção de
praia comprado a peso de ouro, sapatinho de vela, farripa empastada de
gel arrepiada para trás, óculos escuros fashion, bronze a condizer, rapa
do paivante atiça-lhe a mecha, amarfanha o maço e não vai de modas,
chão. Isto quando a menos de 35cm se via uma papeleira, daquelas
amarelas amarrada a um poste de iluminação.
Ela, de loiro
platinado, arcaboiço de dondoca, loiríssima excepto as sobrancelhas e a
raiz do cabelo, saco de praia, fatiota completa, toalha enrolada à anca
volumosa, fios brincos e anéis, tipo montra de ourives ambulante de
outros tempos, lulu rafeirolas ao colo, generosa de busto e repintada
com camadas sucessivas de reboco, arreia o rafeiro que ali mesmo posta
uma supimpa, cagadela, apanhaste tu? Pois nem a madame, a bosta do
rafeireco lá ficou para que algum otário, possa lá atascar o pedúnculo.
De
trás saem três fedelhos, o mais velho para aí com 14 anos, loiríssimos,
vestidinhos com os chanatos de plástico da moda, pranchas de vários
modelos, a piquena debicava enfastiada um bolicoiso, cujo invólucro
ficou a enfeitar a ruela, entre os três faziam mais barulho que uma vara
dos seus homónimos de quatro patas, daqueles que ainda se vêem
mansamente boletando nos montados do Alentejo. A carripana como estava
ficou, que interessa se fica mal estacionada, se fica a ocupar um espaço
onde cabiam dois carros de igual tamanho, que se lixe, temos de ir que
se faz tarde, são 09.35h da matina e a praia espera-nos, poderemos ainda
torrar mais ao Sol, os colegas lá do trabalho ficaram ruídos de inveja,
em cima do tablier, meio de esguelha mas ainda assim relativamente
visível um cartão de autorização de estacionamento de uma unidade
hospitalar da capital cá da parvónia, com o nome de Dr. Qualquercoisa,
que o nome não vem ora ao caso.
Um quarto de hora depois, já
tomei o café da ordem, dei uma debicada no jornal, acendo uma pirisca e
boto-me a olhar o infindável mar, gaivotas que esvoaçam errantes,
guinchando aqui e acolá, reafirmando a posse do seu território, lá em
baixo já se topa a algazarra, dos veraneantes, a saudável gritaria da
infância por junto com o trautear melodioso das conversas das comadres,
das raquetes de bolinhas, coisa irritante e do marulhar das ondas.
Frente
ao tasco onde estou, acompanhado com o amigo Zé, pára um carripano da
moda, todo cheio de asas e saias e cromados, lá de dentro brota um
infernal barulho, parece uma tempestade de alto mar, ao volante um
rapazola de cerca de 30 anos, com o barrete oficial dos indígenas desta
laia, o inefável brinquinho de brilhante à Ronaldo, e aquele ar de
grunho que estas criaturas todas apresentam, do outro lado salta uma
moçoila, calça justíssima, fio dental, a eterna tatuagem do golfinho
azul, um penduricalho atacado na penca, também com o ar típico da fêmea
desta raça, do banco de trás saltam dois fedelhos, mais uma matrona
gigantesca e um pintas, de barrete igual ao do condutor, soquete branco,
camisa aberta e fio de ouro da grossura de um cabo de amarração, acto
instintivo, larga uma valente escarradela, compõe a calça e acomoda a
tomatada, das traseiras fazem sair os inevitáveis cestos e cestas,
geleiras e chapéus-de-sol, bolas e baldes de praia.
Entretanto o
condutor, que até ali, tinha estado parado em cima de uma passadeira em
plena via, impedindo assim os outros de passar, arranca, num verdadeiro
arranque de campeão de estrada, sobe o passeio, encosta bem para a malta
que vem a pé não poder passar e ter de ir para a estrada e lá vai ele,
todo pimpão, orgulhoso da calçola largueirona, o barrete de ar parolo e
as tatuagens étnicas, que se lhe perguntarem o significado ele nem sabe.
Procurei rasto de cadeirinhas para transporte de crianças, mas nem
cheiro delas, o papá fumava dentro da carripana, os putos apanham com
certeza com a fumarola, que diabo só lhes faz é bem para criar
resistência.
Olhei para o amigo Zé e rimos os dois a bandeiras
despregadas, uma das coisas com piada durante este tempo de praia é
estar assim, numa esplanada a ver as marés de Labregos que desembocam
nestas praias abençoadas, quando se está atento a esta avifauna, é que
se percebe a quantidade de labregos que habitam neste país, uns mais
doutorados outros menos mas todos irmanados na labregada, todos labregos
todos iguais.
em: http://baraodatroia2.blogspot.com/2007/10/dirio-de-frias-ii-os-labregos.html