Vamos fazer spam a Igac

A importação de DVD deve ficar isenta de classificação e selo sempre que a encomenda não exceda as 25 unidades, que o título em causa seja proveniente da União Europeia e não tenha sido originalmente tido como pornográfico no país de origem. A proposta parte do Bloco de Esquerda e consta de um projecto de alteração da lei em vigor (DL 39/88) entregue sexta-feira na Assembleia da República. O objectivo é resolver a polémica em torno da certificação atribuída pela Inspecção-Geral das Actividades Culturais (IGAC), dando resposta às queixas dos lojistas que acusam o selo de estrangular a sua actividade, viciando as regras da concorrência a favor das editoras e restringindo o acesso à cultura.

Obrigatório por lei desde 1988, o selo da IGAC serve a dupla função de classificação etária e de qualidade dos conteúdos e de certificação da autenticidade das cópias. Mas há quem associe efeitos perversos à nobreza destas intenções. Entre as vozes dissonantes, sobressai a da Associação Portuguesa de Lojistas do Audiovisual (APLA), que aproveita a oportunidade da iniciativa parlamentar do BE para cumprir a promessa de apresentar queixa junto da Comissão Europeia contra o estado português, o único entre os 25 membros da UE a utilizar semelhante instrumento de fiscalização. "Torna-se então necessário perguntar porque razão só em Portugal isto acontece. Porque razão outros países europeus com um mercado quinze vezes superior ao nosso não se socorrem destas burocracias, sem que por isso desistam de combater a pirataria?" questiona Ricardo Salazar, porta-voz da APLA. "O problema", sentencia, "é que o selo não só favorece monopólios estabelecidos como sustenta o orçamento da IGAC". E é por aqui que a discussão sobe de tom. Mas vamos por partes.

não selo. Para os detractores do selo, está sem causa a sobrevivência das pequenas lojas e de todo o mercado alternativo. Uma ameaça que explicam pelo custo que acrescenta ao produto no caso das importações de um número reduzido de exemplares. Isto sabendo que o serviço prestado pela IGAC custa 37,41 euros (ver caixa) a que acrescem 18 cêntimos por cada selo emitido. E sabendo também, como explica ao DN Abílio Silva, responsável pelo armazém Compact Records, "que há produtos cuja procura apenas justifica a importação de três ou quatro exemplares, para dar resposta a outros tantos clientes". Quando assim é, "os custos do selo significam uma inflação desproporcionada no preço final do produto, porque é preciso recuperar os 37,41 euros nessas poucas cópias, mais os 18 cêntimos de cada selo. O preço final torna-se proibitivo, o que não acontece nas importações em larga escala pelas grandes editoras. Desleal, não acha?"

"Achamos", responde o BE. E é na defesa desta causa que o deputado João Teixeira Lopes avança com esta proposta isenção. "Porque este acaba por ser um imposto adicional para as pequenas lojas" sustenta. "Uma barreira económica agravada por burocracias, porque o processo de atribuição do selo é moroso e as novidades importadas acabam por chegar demasiado tarde à loja. Uma situação que apenas favorece a pirataria, que tem cópias prontas ainda antes das estreias no cinema", conclui.

Disso mesmo se queixa Abílio Silva. Este armazenista da Maia queixa-se de ter "esbarrado vezes sem conta nas burocracias da IGAC" e garante mesmo que "o tempo de espera nunca é inferior a três semanas". Ora, "num negócio como este, que cada vez mais vive da novidade, isso significa o mesmo que vender comida fora do prazo de validade". Mas há mais, acusa Ricardo Salazar. "Exigem-se documentos que muitas vezes são impossíveis de obter, como autorizações das editoras, que não colocam o produto no mercado nacional mas também não estão interessadas em que outros o façam. Quem sai prejudicado?", pergunta. "O consumidor", responde.

E se a APLA afirma que "isto convém ao Estado, que com as receitas do selo suporta toda a actividade da IGAC", também o BE denuncia o "efeito perverso se o selo é a base do orçamento da instituição, ele acaba inevitavelmente por se assumir como finalidade última de toda a sua actividade. E não deveria ser. O que se vê do trabalho da IGAC não chega para justificar essas receitas."

Selo. Coloquemos então as questões que se impõem qual a receita que a IGAC retira dos selos e de que forma esse dinheiro é empregue? À primeira questão, Paula Andrade, responsável máxima da IGAC, promete para breve "dados precisos sobre o real custo de todo o serviço associado ao selo". Porque, "ao valor de venda, há que deduzir a aquisição dos selos à Imprensa Nacional Casa da Moeda, como ainda todos os custos correspondentes ao seu ciclo de produção, pelo que é enganador referir o valor absoluto da receita". Aguardemos, então, e passemos à questão seguinte. Que emprego para as receitas? "São integralmente reinvestidas nos serviços da casa, sobretudo no combate à pirataria. A isto, a inspectora geral soma uma pergunta: "porque razão hão os serviços do Estado ter que dar prejuízo?"

De resto, Paula Andrade não deixa argumentos sem resposta. Desde logo, contrapõe que "os 37 euros servem para pagar o serviço de classificação, não o selo". O que significa que "este custo existiria, mesmo que o selo não existisse. A menos que se acabasse também com a classificação etária, que é uma ideia que ainda não ouvi a ninguém." Nesse sentido, sustenta, "a IGAC não está a limitar a concorrência nem o acesso à cultura, mas a garantir a observância do direito de autor e a genuinidade dos produtos". Porque "este é, até prova em contrário, o mais eficaz instrumento de combate à pirataria". Quanto à acusação da burocracia, responde a inspectora que "é um absurdo falar em três semanas num processo normal. Há selos pedidos de manhã que saem daqui à tarde. A média de entregas é de três a quatro dias. Se leva mais, é porque há autorizações que a lei exige e que estão em falta. Falam frequentemente em três semanas, mas nunca especificam um título com o qual isso tenha acontecido." Fica também registado o desafio.

Ao lado da IGAC, a Associação Portuguesa de Editores de Videogramas (APEV) acusa a APLA de recorrer a "discursos fáceis" e afirma mesmo que "não só não há prejuízo para as pequenas lojas, como muitas vezes há até benefício". Isto porque, "em muitos casos, importam produtos que foram já classificados, o que, portanto, lhes fica mais barato, (ver caixa) e ainda beneficiam de toda a campanha de promoção que já foi feita". E se não houvesse selo? "Então cada um poderia fazer as cópias que quisesse e depois garantir que comprou lá fora. Este é, de facto, um bom instrumento de combate à pirataria". Mas não isento de fragilidades. "Há procedimentos que poderiam ser aligeirados", admite. "Mas não vejo aqui entraves à concorrência. Quem quer fazer as coisas direitas, não pode estar contra o selo."


Lool histórias tal como foi referido lá em cima:
o estado português, o único entre os 25 membros da UE a utilizar semelhante instrumento de fiscalização. "Torna-se então necessário perguntar porque razão só em Portugal isto acontece. Porque razão outros países europeus com um mercado quinze vezes superior ao nosso não se socorrem destas burocracias...